John Lennon desligou na minha cara!

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                Estava na casa do meu amigo Mustang, aliás, sempre achei o apelido dele divertido, hoje à tarde, desde que as férias começaram tenho tido muito mais tempo para ver os amigos, mas não quer dizer que isso tenha rendido textos. Tem rendido muitas histórias engraçadas... Mas quem disse que eu tenho conseguido tempo, ou energia, para escrevê-las? Sempre que penso que vou escrever algo, alguém me chama para fazer algo!
                Essa é a razão de eu só escrever de madrugada, ainda assim é difícil ter forças para não dormir enquanto digito. Mas como eu dizia estávamos sentados na varanda, bebendo refrigerante e jogando nosso querido jogo de cartas, quando começamos uma amistosa conversa sobre nossos referentes trabalhos.
                Mustang atualmente está trabalhando com telemarketing. Acho eu que deve ser uma mão na roda pra escrever nossas histórias... Como a que ele me contou. E que estou usando para escrever essa crônica, que estão perdendo seu tempo lendo.
                Ele disse que estava em sua mesa de trabalho, arrisco que tomando café, quando recebeu uma ligação, e pela insistência em não desistir após cinco toques fez com que ele atendesse.
                O cliente estava insatisfeito com alguma coisa, não recordo com o que, mas pareceu engraçado na hora por que eu não parava de rir... Talvez efeito da cafeína no refrigerante? Duvido, nunca tive isso.
                Ele tentava contornar as reclamações retrucando, sabiamente, com o script que a empresa havia lhe dado ao começar. Aquele, maldito, padrão de “você vai estar recebendo...”, sempre achei tão estranho, usar três verbos quando apenas um já dava conta do recado.
                Mas o cara era insistente, até o momento em que ele se cansou e disse:
                “Você sabe com quem você está falando?! Meu nome é John Lennon!”
                Eu preferiria que ele houvesse me dito essa parte quando eu não estivesse tomando refrigerante... Foi tenso engasgar, cuspir e rir ao mesmo tempo.
                Acho que ele guardou isso para o final de propósito, pra tornar tudo mais emocionante. Como sempre. Não sei por que ele faz isso, sempre que ele conta alguma história ela é, naturalmente, épica!
                Ele confirmou que a voz do cara era mesmo parecida com a do músico-lenda, o que tornava tudo mais engraçado que o normal. Além do mais, ele procurou no sistema o cadastro do cliente e viu que realmente existia um “John Lennon” nos registros.
                A parte final da história fora abafada por risos e minha tosse. Mas no fim o Sr. Lennon acabou ficando com raiva de não conseguir ser devidamente atendido, Mustang é fã do Lennon, sem mencionar o fato de ele ser um grande brincalhão, e eu aposto que isso deve ter contribuído para a falta de profissionalismo dele, e desligou na cara dele!
                Após alguns minutos tentando parar de rir, ele concluiu a mim a moral da história.
                “John Lennon desligou na minha cara!” dizia ele sorrindo “Sou foda!”.


Em homenagem e referência a Magno Mustang. É pra você titio.

Estar sozinho...

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            Novamente na feira. Faz algum tempo desde que estive aqui pela ultima vez.
            Desde que descobri a loja tenho vindo muito pouco aqui. E na maioria das vezes a contra gosto.
            Aqui tem sempre tem gente demais. Muita gente.
            Isso me incomoda. Afinal de contas, aprendi a ser sozinho. A gostar de estar sozinho.
            Não que eu não goste dos meus amigos, mas às vezes... Sinto-me estranho perto deles, estranho por estar cercado de tanta gente.
            É estranho pensar nisso agora... Antes as coisas eram mais simples. O que eu fazia afetava apenas a mim mesmo. Hoje eu tenho que pensar se o que faço faz mal a alguém com quem me importo.
            Em outras palavras, hoje eu tenho que pensar para não machucar alguém. Mesmo que sem querer ou pouco. Agora eu tenho com quem me preocupar. Isso é complicado pra mim, fui progredindo de maneira diferente do habitual. Pessoas comuns sempre tinham a quem cuidar. Se eu não cuidava de mim, ninguém mais cuidaria. Provavelmente só minha mãe ligaria. Só ela importar-se-ia se algo acontecesse comigo.
            Hoje tem muita gente que se importa. Muita gente. Gente demais...
            Sinto-me exposto assim. Como um rato de laboratório a ser estudado após uma série de exames e testes...
            É normal, eu acho. Estar acostumado há tanto tempo com alguma coisa que quando ela muda você a acha estranha.
            Há dias, em que eu penso em como gostaria que as coisas voltassem a ser como eram antes. Em como eu andava sozinho, como eu vivia sozinho. Era simples, fácil... Era solitário, vazio e deprimente, mas era a minha vida. E eu gostava dela.
            Mas nesses mesmos dias em que penso nisso. Eu me lembro dos bons momentos que tenho vivido. Momentos que não existiriam se eu continuasse a ser quem era antes.
            Estar com as pessoas me fez amolecer. Fez com que eu pudesse experimentar o que chamavam de alegria. Alegria sem motivos. Alegria de verdade. Calor que contagia... Eu gostei. Mas ao mesmo tempo não gostei.
            Tenho receio, não medo, do que é novo. Temo por aquilo que sou acostumado deixar de existir. Farei a pior referencia que poderia ser feita a mim, sinto-me como um vampiro. Um vampiro clássico, dos que sofre com o passar das eras, vendo aquilo que ama se desfizer com o arrastar do tempo. Seria bom, se assim como ele, eu também esquecesse essas coisas. A preservação de um vampiro, era sua perca de memoria, qual será a minha?
            Sinto-me sujo pela referencia que fiz... Simplesmente não gosto de vampiros. Sério, não gosto mesmo. Eu só li o Drácula por que sabia que ele ia morrer no fim! Isso é algo que me dá prazer sobre algo com vampiros, vê-los morrer. Mas isso não vem ao caso.
            Ser sozinho era minha forma de estar bem. Mesmo hoje, não sei como agir com as pessoas. E ando com elas já tem quase um ano!
            Bom, não sei se algum dia ainda vou saber. Sou um eterno travado social. Sempre e pra sempre.

            Não vi muito sentido nesse texto, mas ele é importante. Para mim pelo menos. Não sei o que vão achar, mas não me importa. É mais um desabafo do que algum texto real. Não ligo para o que vão dizer, sou quem sou. Nunca serei alguém a quem não posso ser. E se eu mudar, quem eu serei... E o mais importante, quem vai ser eu?

Caçada ao pesadelo

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Diário de Victor Lopes


14 de agosto – Caçada ao desconhecido.

            Estou em Santa Luzia, próximo a minha antiga casa, está frio, como sempre. Estou caçando. Ainda não descobri o que, mas sei que estou...
            Estou com esse habito. Diários, não sei dizer quando comecei, mas, me ajudam a lembrar das coisas, a lembrar do que cacei e do que passei.
            Separei-me de meus companheiros por alguns dias. Precisava de tempo comigo mesmo, e assim rumei para casa, precisava de um lugar para pensar... Mas parece que nunca poderei descansar por mais de algumas horas, tempo em que uso para dormir e escrever essas linhas, o mau sempre me procura ou esbarra comigo.
            No caminho, soube de um caso. E parece que sou mais instintivo do que pensava ser. Joguei-me de corpo e alma para caçar o desgraçado. Já descobri o seu padrão. Garotas no fim da adolescência. E parece que gosta de vê-las enquanto dormem. Poderia parecer apenas mais um maníaco sexual... Mas seria um maníaco muito mais maníaco do que o esperado. As vitimas são encontradas, literalmente, aos restos. São mastigadas e depois abandonadas em suas camas. Penso que é possível terem sido estupradas também... Mas é apenas uma suposição de minha mente paranoica.
            Hospedei-me em hotel barato da rodovia. Não quero me demorar mais do que o necessário por aqui. Não gosto da aparência da mulher que me atendeu, ela não parece ser alguém normal...


15 de agosto – Em busca do desgraçado.

            Descobri o que estou caçando. Um maldito pesadelo. Conhecido por aqui como Jurupari. Literalmente, no idioma indígena daqui, isso significa “sono” ou “pesadelo”. Atacando apenas no mundo dos sonhos. Esse parece ser um caso especial... Não são muitos os que conseguem se mostrar ao plano físico.
            Armas comuns não irão funcionar, por sorte tenho o que o mata. Uma faca de prata. Monstros em geral não costumam resistir bem à prata. Algum dia ainda irei pesquisar o real motivo para tal...
            Noite passada, sai para caça-lo. Não foi bonito. Mais uma garota se foi. E agora, mais uma morte está impregnada em minha mente. Mais uma alma que eu não pude salvar. Sinto-me frustrado.
           Preciso mata-lo logo. Acho que preciso de uma isca, mas quem iria querer se expor para tal? Preciso de ajuda...


16 de agosto – A ajuda logo veio.

        Consegui minha isca, ao menos espero que ela sirva, é irmã da primeira garota. Julia alguma coisa, não me interessei por seu sobrenome, mas, ela quer vingar a irmã. Parece-me que eram muito unidas. Pude contar a ela quem eu era, o que fazia e o que precisava dela.
            Ao anoitecer, encontrava-me em seu quarto. Expliquei-a que deveria relaxar dormir seria o adequado, enquanto eu realizaria o ritual para trazer a criatura diretamente a nós... Na verdade estava tornando-a o alvo mais chamativo para o pesadelo, mas preferi ocultar isso dela, nem tudo é para ser contado.
            Com o rito feito, o que poderia fazer era esperar. Cedo ou tarde ele apareceria. Esperava pelo bem dele que fosse cedo...

            Eu cochilei! Sentado em uma cadeira próxima a cama de Julia, acabei caindo no sono. Acordei assustado, com o grito da garota ecoando pelo quarto pouco mobiliado.
            Mesmo com o quarto estando escuro, pude ver o Jurupari.
            Ele era, realmente, como dizia na lenda, feio que dava dó. O maldito sorria com aquela boca torta, faltando-lhe dentes e os poucos que ainda lhe restavam eram muito tortos. Parecia que iria devorar a garota apenas com os olhos. Não sei dizer se era desejo alimentício ou sexual. Espero não saber, queria apenas mata-lo e poder partir daquela cidade.
            De um salto, eu o ataquei. Tentei acertar-lhe o pescoço, mas apenas feri seu peito. Um corte feio, mas parecia não ser suficiente. Com ira ele jogou-me contra a parede e manteve-me lá. Mesmo sem me tocar ele estava me matando. Odeio muito esse tipo de criatura... Gênio. É isso que o pesadelo é na verdade. Um gênio maldito que se mostra apenas nos sonhos. Gostam de brincar com as pessoas.
            A faca fora parar do outro lado do quarto, sentia que ele se aproximava de mim. E cada vez mais o pouco ar que eu tinha se esvaia.
            Julia, que estava parada, paralisada eu diria, moveu-se em direção a ele. Ela empunhava minha faca. Não havia visto que ela tinha a pego. Ela não conseguira acertar o pesadelo, mas seu movimento conseguira fazer com que ele me soltasse.
            Livre de seu domínio, consegui então segura-lo por suas costas. Deixando Julia livre para que pudesse desferir a faca diretamente contra seu torso.
            O que houve em seguida fora preocupante. Nunca havia enfrentado um pesadelo que explodisse quando morto. A faca transpassara seu corpo, morto sim, e assim fizera com que eu fosse atingido pela mesma. Estou com mais uma cicatriz em meu abdômen. Uma pequena recordação de mais uma caçada.
            Ainda assim, as coisas estão erradas... Gênios que explodem?! Onde já se viu algo disso?


18 de agosto - Partindo.

            Estou finalmente saindo desse lugar. Já não aguentava mais.
            Julia me fez ficar em sua casa por mais um dia. Para que o ferimento tivesse tempo de se fechar. Não consegui faze-la mudar de ideia. Tive que ficar... Não gostei da ideia, isso me mantinha preso à cidade.
            Mas enfim estou indo. Tenho que ir para casa.
            Mais um caso resolvido, mais uma cicatriz, mais uma vida salva, mais uma vez posso sair de um lugar sem receio de ter deixado algo inacabado.
            Talvez em casa eu possa pensar. Talvez consiga as respostas que procuro. Talvez encontre a solução... E talvez algo tenha sobrado naquele lugar, isso se já não saquearam a casa de minha infância.
            Sigo agora pela rodovia... Assim vivo. Sempre caçar e jamais parar.

Quando eu partir...

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            Estava voltando para casa quando comecei a pensar sobre isso.
            Eu sempre penso em como quero viver, o que quero fazer... Mas quase nunca paro para pensar em como quero morrer. Ou como me imagino quando estiver morrendo.
            Eu acho que acabaria mesmo morrendo sozinho. Não por viver sozinho, ou por ser um miserável amargurado como sou. Mas simplesmente pelo fato de que eu não consigo não me imaginar assim.
            Eu sempre disse que iria querer morrer sobre alguma forma de escrita, com uma xicara de café ao meu lado e uns biscoitos do outro. Em suma, morreria sob minha mesa.
            Não dá pra me imaginar tendo uma morte de outro tipo se não essa.
            Sou o tipo de pessoa que não se imagina tendo uma família. Tendo filhos pra criar. Ou tendo esposa.
            Não dá pra me imaginar tendo uma vidinha normal de pessoas normais... Ou eu simplesmente sou um filho-da-mãe que não consegue se imaginar sendo ordinário? Sim, ordinário só pra não dizer “comum”.
            Antes que me arremessem pedras, ordinário apenas quer dizer comum ou trivial. Pelo menos nesse caso não quer dizer nada sobre vulgaridade.
            Tenho medo.
            Medo de ser uma realidade minha. Morrer sozinho. Tenho medo e espero por isso. Não sei dizer, talvez eu realmente queira que isso aconteça assim. Parece um final digno para mim. Eu não iria querer morrer de outra maneira.
            Não iria querer partir de outra forma.
            Mas outra coisa, além disso, me perturba. O famoso, “descansar em paz”. Será que eu descansarei em paz?
            Será que meus olhos se fecharão quando eu partir dessa para uma... Não sei dizer se vai ser uma melhor. Mas será que eles irão se fechar quando eu partir?
            Sempre ouvi dizer que pessoas que morrem de olhos abertos, jamais descansam em paz.
            Isso me assusta um pouco. O descanso eterno será um tormento eterno? Por que se for, para que então que eu vou morrer? Se for pra morrer e não descansar, prefiro estar vivo.
            Viver a vida e não a morte. É isso que deve ser feito.
            As pontas da vida não deveriam importar tanto, somente a vida em si.
            Estou vivendo não estou? Estou tendo bons e maus momentos. Cada momento que já vivi foi necessário para construir quem eu sou. Cada momento que eu estou para viver vai ser necessário para me aperfeiçoar e fazer com que eu melhore onde deva melhorar... Fazer com que eu largue o que deva largar... Fazer o que tenha que fazer...
            É disso que a vida é feita. De momentos.
            Não estou dizendo que não devem ser feitos planos para a vida.
            Estou apenas dizendo que os momentos devem ser aproveitados, tanto os maus quanto os bons. Por que sem eles, qual seria a graça da vida?
            Vida fácil? Para que eu iria querer algo assim? Não rende crônica! E é disso que eu vivo!
            Minhas crônicas. Elas são criadas a partir dos momentos em que vivo. Cada uma de um momento em particular. Cada coisa é o que é. Cada momento foi vivido. Foi superado, ou não.
            Se eu pudesse mudar algo que já me aconteceu, seria o fato de meu café ter acabado ontem... Não mudaria mais nada. Gosto da minha vida. Mesmo sendo uma droga.

            Então é isso, acho que quando eu partir estará tudo bem, pelo menos para mim. Posso não descansar em paz, mas se eu voltar como fantasma ou coisa do tipo... Bem, tenho pena de quem eu quiser atormentar.
            Tudo bem, sem brincadeira de fantasmas e essas bobagens.
            Eu posso não descansar em paz, mas que eu vivi uma boa vida... Ah! Isso eu vivi!
            Ainda vivo! Não estou morrendo.
            Na verdade estou! Todos estão! A cada segundo que passa, estamos mais próximos da morte!
            Mas o que eu quis dizer, é que não irei morrer nesse instante. Não vão se livrar de mim tão fácil.

            Pelo menos por enquanto...

Nada mais importa... Ou quase nada.

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                Eu havia acabado de chegar quando li aquilo.
                Havia passado o dia inteiro na loja, meu refugio. Um lugar onde me sinto a vontade e não estou sozinho. Finalmente encontrei um lugar assim.
                Praticamente todos que vão lá gostam das coisas que gosto. Jogos e quadrinhos.
                As coisas estavam muito paradas. Eu ansiava por algo novo. Algo que valesse a pena de se escrever... Eu não sabia o que esperar, só esperava...
                Agora, não sei se valeu a pena. Mas pelo menos, tenho algo a escrever. Agradeço a você, garota do capitulo anterior a Isabela. Você me machucou legal agora, mesmo eu já tendo te fechado na minha vida há muito tempo.
                E nem foi por eu ter perdido alguém que eu amei, foi por eu ter perdido uma amiga. Uma boa amiga. É só por isso que estou triste.
                Eu estava bem. Satisfeito em tê-la apenas como amiga. Mas parece que ela era uma tremenda paranoica. Mesmo eu dizendo que estava tranquilo, acho que ela ainda achava que eu sentia algo mais... Egocêntrica.
                Eu também sou, mas sei onde estão os meus limites!
                Com raiva? Claro que estou. Não seria eu mesmo se não estivesse.
               
                Está amanhecendo. Eu precisava de um tempo antes de conseguir escrever. Passei a noite em claro. Tentando dormir para descansar a mente, mas foram tentativas em vão. Não consegui nem ao menos cochilar.
                Muitas vezes enquanto escrevo isso, eu paro. Paro para pensar, reler o que já escrevi e muitas vezes para apagar as coisas e reescrevê-las. A essa altura já devem ser oito horas. Não tenho certeza, meu relógio não está marcando o horário certo.
               
                Eu parei de escrever por alguns minutos, precisava preparar meu café e comer algo. Agora, com uma xicara de café ao meu lado e uns biscoitos do outro, estou com as palavras organizadas em minha mente. Ou não.
                Eu fico lendo e relendo aquele e-mail direto. Desde que chegou. Não consigo parar com isso. Quero, tento... Mas fracasso. Talvez eu não queira parar de ler. Não sei.
                Ela pediu que eu não a odiasse. Um pedido ao qual será o ultimo que atenderei a ela. Não a odeio. Mas não gosto dela. Nem um pouco.
                Apenas mais uma na multidão. Isso que ela se tornou pra mim.

                Eu sou o cão. Nas palavras dela, o “corpo-presente”. E ela a gata, a “observadora”. Isso nunca daria certo mesmo. Foi uma surpresa, e ao mesmo tempo estranho, termos sido amigos por tanto tempo.
                Como me disseram certa vez, eu sou sessenta. Ela varia de cinco a cinquenta.
                E agora, estou sem saber o que fazer... O que faço se o abraço que me reconfortava quando estava triste é exatamente o da pessoa com quem eu mais estou triste e decepcionado? Estou perdido. Sem rumo, sem nada... Só vazio... Outra vez.
                Ela me trouxe a vida novamente para que? Qual fora a razão?!
                Agora... Eu nunca vou saber. E acho que nem importa. Vai ser uma das poucas coisas que vão ficar sem resposta para mim. Não estou nem ai.
                “Foda-se, eu agora tenho uma bengala!” é o meu pensamento para tudo isso agora. Não faz sentido, mas é divertido dizer. Com bengala agora eu posso andar mais. Não força tanto a perna. Então dói menos. Ou faz parecer que não dói tanto.
               
                Só queria duas coisas agora.
                Uma é o prêmio da mega-sena. Por quê? Por que assim eu posso viver como eu quiser e fazer o que eu quiser. Já faço e vivo. Mas com dinheiro ficaria mais fácil.
                A outra é encontrar alguém que não se mostrasse uma completa babaca no fim... Mas será que isso é o fim? Eu duvido, e olha que quem está me contradizendo sou eu! Então algo ainda está por vir. Eu posso sentir no ar!
                Espero que não seja algo ruim. De coisas ruins estou enfiado até as orelhas.

                Por que viver tem que ser tão difícil?
                Eu mesmo me respondo. “Por que se fosse fácil seria miojo e não a vida”.
                Droga de auto resposta...

                Eu não sei.
                É só isso que me vem à mente agora. Não sei o que fazer, não sei o que pensar... Só sei o que não preciso. Não preciso ficar sozinho. Não mais.
                Tenho amigos, isso é o que me importa.
                Alias, foi graças a ela. Agradeço a ela por isso. E talvez seja justamente isso que me impeça de odiá-la. Eu queria muito. Muito mesmo. Mas é contra meus princípios.
                Malditos princípios... Sou assim, ao mesmo tempo em que me amo, eu me odeio. Sou um cão, sou um lobo, sou uma criança, sou um idoso. Sou tudo e não sou nada.
                Pensador e realizador.
                É assim que vivo. Em conflito comigo mesmo. Sempre e pra sempre.
                De resto, nada mais importa.

                Estou encerrando por agora.
                Ouvindo Metallica, Nothing else matters, o que parece se encaixar no momento.
                Estarei aqui esperando um amigo aparecer antes de ir para a loja.
                Então... Enviarei esse texto ao editor. Se ele gostar, será publicado. Se não... Foda-se, eu tenho uma bengala!

O que passou, passou...

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                Esta amanhecendo. Meu relógio marca 05h57min.
                Eu deveria estar dormindo agora, tenho que sair às 13h, mas quem disse que quero ou estou com sono?
                Acabei de voltar de uma reunião na casa de um amigo. Estávamos jogando. Foi engraçado, muito mesmo.
                Muitas risadas, piadas, brincadeiras foram feitas nessa noite e madrugada.
                Em certos momentos, achei que minhas costelas iriam quebrar de tanto que ria. Nem minha perna me incomodava mais, ela quase não existia pra mim.
                Algumas horas antes de irmos jogar, estávamos com o restante de nossos amigos. Não todos, mas uma grande parte estava conosco. Foi uma noite relativamente boa. Com seus altos e baixos.
                Consegui, após quase um mês, falar com um amigo, melhor dizendo irmão, sobre o que me afligia antes. Agora finalmente tenho capacidade de falar. Finalmente consigo falar sem me machucar. Sem sentir tanta dor.
                Ela.
                Um dos meus maiores enganos. Não sou do tipo que erra, mas quando erra... A coisa é feia.
                Não digo que sou perfeito. Não erro por que muitas vezes nem mesmo tento algo. Embora eu tente na maioria das vezes...
                Sou como o “palhaço”. Sempre a favor do erro, mas, ao mesmo tempo, tento evitar o mesmo ao máximo.
                Bem, não vou me desviar de meu ponto inicial... Talvez um pouco, mas não agora.
                A alegria que me fora proporcionada por ela, foi tão proporcional quanto à tristeza que ela me fez sentir recentemente.
                Sou do tipo que é difícil gostar de alguém. E sou do tipo que não gosta de muita gente... Mas também sou do tipo que é realmente muito difícil odiar alguém.
                Sei que não sou o melhor exemplo de pessoa que alguém poderia ver ou querer ter como exemplo. Mas ao menos sei até onde posso ir. Sei até onde minhas ações podem ir sem ferrar tudo e a todos.
                Ela não. Atualmente a acho uma pessoa horrível. Uma mentirosa que quebra promessas e usa as pessoas somente a seu favor sem se importar com as mesmas...
                Eu sei que sou um caso perdido. Mas como eu dizia a meu antigo mentor no ramo das crônicas. “Um caso perdido maneiro”.
                Nos últimos dias, eu me sentia vazio. Sozinho.
                Ainda me sinto. Mas estou melhorando. Agora que estou escrevendo, sinto que estou melhorando muito mais rápido do que antes.
               
                Voltando a ela.
                Ela fora a causa de uma felicidade muito grande. Tão grande, que eu não me continha em mim. Mês passado eu me sentia bem apenas na menção do nome dela. Mas hoje, ouvir o nome dela... Bem, só me dá vontade de arrancar minhas próprias tripas e as de quem a mencionou... Não necessariamente nessa ordem.
                Estou escrevendo enquanto escuto uma musica que não escuto muito. Uma musica que se adequa a mim agora. “Só os loucos sabem”.
                Eu já havia decido não me abater pelo que aconteceu... Mas não dá pra esquecer o fato de ter sido usado. E descartado quando não era mais necessário...
                Mas como diz na letra. Agora eu sei o que fazer, vou recomeçar. Tudo.
                O que aconteceu, aconteceu. Eu não posso mudar. Adoraria. Daria minha perna boa pra mudar! Mas não posso. Então... Foda-se.
                Não a vejo há tempos, desde o acontecido. Minhas ultimas memorias sobre ela não existem mais, não completas ao menos, mas lembro de pequenos momentos... E parece que deles, lembro como se talvez não pudesse esquecer. Talvez minha mente queira me jogar cada instante cada vez mais para baixo, como se eu não quisesse me ajudar. Um deles fora o fato de eu estar na frente dela, ela estar me olhando e, ainda assim, passar reto e depois que eu a chamei ela dizer que não havia me visto.

                Usar-me apenas pra tentar conseguir o que queria...
                Desejei muito manda-la ao inferno... Não a mandei apenas por uma brincadeira... Inferno. Esse é o nome do meu quarto. Somente por esse fato não a mandei para tal lugar.
                Eu sai mancando o mais rápido que minha perna não permitiria. Andei o indevido, me machuquei. Muito.
                A dor física tentava consolidar-se com a emocional. Era quase tão forte quanto ela. Mas não doía o suficiente para me fazer apagar...

                As duas linhas acima resumiram meu mês. E as que virão, resumirão meu agora.
                Eu te odeio. Muito.
                Quase tanto quanto a mim mesmo por ter me deixado cair em sua rede babaca.
                Mas em nome de todos aqueles que se importam comigo, em nome daquele que se importou e não está mais comigo, em meu próprio nome, eu te digo aqui e agora...
                Por mais que eu te odeie, por mais que você tenha me dado todos os motivos necessários, e mais alguns desnecessários, eu não consigo lhe desejar mal. Odeio você, mas ainda assim desejo que fique bem.
                Quem sabe algum dia você se torne alguém que valha a pena. Alguém que valha a pena para alguém.
                Para mim nunca será. Não mais.
                Para mim, você não é digna nem mesmo de pena.
                Você não é mais motivo para que eu fique mal. É apenas alguém com quem fiquei. Alguém que veio e se foi. Alguém a quem eu não daria nem mesmo um alô se encontrasse na rua.
                Eu não presto. Sei disso.
                Então isso pra você deve ser pior do que muita coisa, já que não vale nem mesmo a minha raiva.

                Termino de reler minhas linhas... Parece que não sou lá tão ruim quanto penso que sou... Talvez ainda haja algo que dê pra salvar em mim... Mas não importa, não agora.
                Termino aqui, agora ao som de “Fly away from here”, tomando um pouco de refrigerante e talvez começando alguma outra crônica. Isso deixaria meu editor animado...
                Não contei nem a metade do que aconteceu, do que eu queria ou do que deveria... Mas não interessa, afinal de contas, o que passou, passou. E só o tempo irá ajudar agora...

Cinema

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            Estava quente. Muito quente.
            O ar estava muito seco, eu não respirava corretamente. Não conseguia.
            Eu estava entediado, havia descido da sala para o pátio do colégio. Educação física, não é uma das minhas matérias favoritas... Afinal de contas nem andar direito posso!
            Sentei-me a uma das poucas sombras que ali havia.
            Enquanto falava com um dos poucos amigos que tinha naquele lugar, falávamos sobre musica e filmes, tentava escrever... Bom, parece que estou conseguindo.
            Segunda-feira. Provavelmente o pior dia da semana. Não apenas por ser o começo da semana, mas também não tenho aonde ir à noite, nem tenho como encontrar meus amigos.
            Pela conversa que estava tendo, cheguei à conclusão de que gostaria de ir ao cinema. Lugar aonde pouco vou. Mas qual é a graça de ver um filme sem ter alguém para te acompanhar e após o mesmo, comentá-lo?
            Eu precisava de companhia... Mas quem estaria livre numa segunda-feira?

            Após muitas ligações, onde poucas foram atendidas, descobri que as segundas-feiras eu volto a ser o lobo solitário que era antes de conhecer meus amigos.
            Não consegui nenhuma companhia... Mas eu iria de qualquer maneira. Precisava de algo para terminar a crônica. Para torna-la interessante.

            O restante da aula passou bem lentamente. Eu queria sair dali. O mais depressa possível. Não tinha companhia, mas fazia muito tempo que eu não saia para me divertir sozinho... E eu sei muito bem que eu ando precisando me divertir. E isso me gerou uma ansiedade sem motivo.
            Quando finalmente pude sair daquele lugar, fui da maneira mais rápida que minha perna permitiria até o ponto de ônibus.
            A viagem de ônibus até a praça próxima a minha casa, fora como sempre. Completamente tediosa. Comigo quase dormindo usando meus óculos escuros, já escurecendo, com a cabeça encostada na janela.
            Antes de ir ao cinema, fui até minha casa. Melhor dizendo, até o quarto que alugo. Precisava de uma camiseta que não fosse a do uniforme estadual. Odeio esse “azulão”...
            Joguei minha mochila sobre a mesa, despi o uniforme e peguei uma camiseta qualquer que estava de fácil alcance. Era minha camiseta favorita, com estampa dos Ramones.
            Não me demorei muito em meu quarto, tentei mais uma vez encontrar alguém que pudesse me acompanhar. Como não encontrei, fui para o cinema.
            Lá chegando, notei que não havia uma fila muito grande. Na verdade, eu não chamaria aquilo de fila!
            Eu decidi por ver um desenho. Afinal de contas, o filme que eu queria ver eu sabia que era bom e, bons filmes devem ser vistos com alguém para que depois de vê-los, sair-se discutindo o mesmo.
            Eu sabia que segunda-feira era um dia de pouco movimento... Mas eu esperava que houvesse mais alguém naquela sessão. Mas não! Havia apenas eu lá!
            Nem mesmo o projetista estava lá. Ele apenas ligara a maquina e sumira!
            Provavelmente ele já não aguentava mais aquele desenho. Foi à conclusão que cheguei.
            Como estava sozinho, eu pude escolher o melhor lugar para melhor aproveitar o “filme”. E enquanto o mesmo estava passando, eu não tinha receio algum de comentar ou rir em voz alta.
            Até que não era tão ruim. Era bastante engraçado. Cheio de piadas inteligentes e referencias a outros filmes.

            Com o fim do filme parei em uma barraquinha de lanches, comer um cachorro-quente. Enquanto esperava, observava o pouco movimento das ruas. Os limpadores-de-rua exercendo suas funções; pessoas esperando os ônibus para irem, talvez, a suas casas; os carros passando...
            Ia a minha casa para poder comer meu lanche. Não, eu não como em publico. Não gosto de pessoas me encarando enquanto como... Acho estranho.
            Lá chegando, pego meu notebook para terminar a crônica. Com metade do cachorro-quente na boca, um copo de limonada ao meu lado e mais uma crônica sendo encaminhada... É assim que encerro o meu dia. Não foi um dia interessante, nem admirável... Mas foi meu o dia. Foi a minha segunda-feira. E ela não foi tão ruim quanto às outras segundas-feiras.

Insônia

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            Madrugada.
            Estava sentado em minha cama pensando nas coisas. Estava a horas “bolando” sem conseguir dormir.
            Após pegar meu notebook, comecei a escrever isto.
            Maus hábitos de um cronista. Tudo que tem me acontecido deveria ter rendido alguns textos... Mas só agora consigo escrever. Só agora, após muito pensar, consigo me expressar...
            Por onde começar?
            Talvez pelo maldito começo. Mas quem diz onde começam as coisas? Quem determina onde os fatos acontecem?
            Começarei por onde eu determino que seja o começo.
            O amor, esse é uma droga... Faz você se iludir fazendo parecer que está feliz. Mas ninguém nunca percebe que as pessoas são egoístas. As pessoas, por mais que digam o contrario, importam-se mais consigo mesmas do que com os outros. Não passam de robôs medíocres que tentam não morrer sozinhas em suas tristezas.
             Eu fui um tolo. Fui feito de idiota. Fui um grande idiota. Por ter acreditado na loba em pele de ovelha. E por mais que eu tenha me avisado, deixei-me levar.
            Como um rato que após muito apenas pressionar o botão do prazer, esquecendo-se do botão de alimentos.
            Não falarei muito disso para quem não conheço... E pra quem provavelmente não liga. Apenas direi o que aconteceu, sem os detalhes detestáveis.
            Após apaixonar-me, fui iludido por minha mente. Acreditava que ela também me amasse. Ou era isso que eu esperava... Agora, sei que ela não só não me amava como também me usou. Usou-me para conseguir aquilo que queria.
            Sinto-me péssimo. Meus amigos percebem isso, mas não falam. Eles me conhecem. Sabem que eu preciso de um tempo para ficar sozinho antes de poder falar.
            Eles mesmos têm problemas maiores. Parece que os problemas dessa vez vieram de vez. Bem dizem que a desgraça nunca vem sozinha... Não pedi a eles permissão para falar dos problemas deles aqui, então nada será dito sobre.
            Voltando a minha pessoa. Afinal de contas, sou um grande filho-da-mãe.
           
            Perdi alguns segundos do meu tempo olhando pela janela. Já está amanhecendo. Outra noite sem dormir. Grande coisa...
            Os dias que se passaram desde que percebi o que acontecia, eu lutava ao máximo comigo mesmo para não bater a cabeça com força na parede ou me dopar pra não acordar por um período longo de tempo.
            Só não o fiz porque sabia que preocuparia as pessoas que comigo se importam. E muito provavelmente me fariam voltar ao coma induzido depois de eu me recuperar.
            Mas a dor continua. Não consigo parar de senti-la.
            Não a dor de perder alguém que eu, supostamente, amava. Mas a dor de ter sido usado. A dor de ter confiado em alguém que não deveria.

            Ouço sons estranhos. Passos.
            Batidas em minha porta. Decido não responder enquanto a pessoa não se identificar.
            “Luigi! Sou eu!”
            Fora a voz de um amigo. O que ele fazia aqui em casa às... Eu não sabia que horas eram. Surpreendo-me ao olhar para o relógio e descobrir que já eram oito horas.
            Novamente perdi a noção do tempo enquanto escrevia. Fazia muito tempo que isso não acontecia. Talvez essa crônica-desabafo seja melhor do que parece ser...
            Saio de minha cama, tentando reestabelecer o equilíbrio. Com certa dificuldade, manco até minha porta e a abro.
            “Trouxe pães.” Ele disse exibindo o pacote que havia em sua mão. “Posso entrar?”
            A pergunta era mera formalidade. Ele já estava entrando.
            Depositara em minha mesa o pacote e sentara-se em uma das cadeiras.
            “Quer café?” Ofereço. É a única coisa que tenho costume de tomar pela manhã. Isso é, quando acordo de manhã. Em geral estou deitado até as onze horas, horário em que me arrumo para sair de casa.
            “Aceito sim.” Ele sorria. “O que faz acordado a esse horário? Normalmente teria me enxotado ou diria para que eu ficasse a vontade por que voltaria a dormir...”.
            É ele me conhecia bem.
            “Eu não dormi ainda.” Respondo-o
            “Dá pra ver pelas olheiras. Voltou a escrever pelo menos?”
            Eu deixei escapar uma risada. Talvez sarcástica ou falsa, não sei dizer.
            “Sou tão previsível assim? Só por que não durmo quer dizer que voltei a escrever?”
            “Você não me respondeu.”
            Droga! Eu não consigo mais nem enrolar um amigo. Estou mesmo ficando ruim.
            “Estou quase terminando uma crônica agora.”
            “E como está indo?”
            Apenas sacudi meus ombros.
            “Entendo...”

            Talvez seja assim que eu deva terminar a crônica.
            Observando em segundo plano meu amigo passar manteiga em um pão, ouvindo o som da cafeteira e ouvindo Led Zeppelin.
            Ao terminar essas palavras, envio a crônica ao meu redator e sirvo-me de uma xicara de café e de uma metade de um pão... Começando uma conversa verdadeiramente decente com meu amigo.
            Talvez agora eu seja capaz de falar com ele e os outros sobre o que está acontecendo mais facilmente. Talvez eu consiga, talvez não... Quem sabe?

Noite chuvosa

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Era um dia cinza, nublado se preferirem, sem sol e levemente frio.
Caminhava pelas ruas, com minha jaqueta de couro, enquanto uma leve garoa cismava em cair sobre mim... Ia para lugar nenhum. Meu destino era desconhecido até para mim.
Caminhar não é a palavra, mancando seria o correto. Afinal, não é fácil conviver com a dor. Desde sempre, mancar é algo natural para mim. Provavelmente eu não saberia andar de outra maneira senão mancar.
Estava passando por mais uma época dos meus problemas com a escrita. Por que isso era um problema? Ainda é. Mas isso por que eu sou o que chamariam de escritor, desses que devem ter a cara enfiada em um caderno fazendo suas anotações e observações. Mas eu não conseguia escrever nem mais uma maldita linha... Até o momento de agora, onde uma coisa conseguiu tirar minha mente das minhas preocupações em que estava focada, causando-me o bloqueio.

Meus pés levaram-me até a pista de skate. Estava deserta. Certamente o frio e a chuva afetavam aos skatistas, que costumam usar bermudas e camisetas, de maneira negativa e os impedia de realizarem seus movimentos sob suas “pranchas com rodas”.
Apesar disso, e da chuva ter engrossado, decidi ignorar o meu leve cansaço e a dor em minha perna. Segui meu caminho.
Ao erguer a gola da jaqueta, para proteger a nuca cuja qual o vento castigava severamente, escutei risos conhecidos.
Escondidos embaixo de um pequeno grupo de arvores, um cara e uma garota.
O cara, de óculos, a barba levemente por fazer. Usava um casaco de algodão e carregava sua pasta que usava como mochila. A garota, com o cabelo molhado pela chuva e um casaco negro. Ambos rindo muito sobre qualquer coisa que tenham dito ou feito.

– Hey! – Os chamei, havia os reconhecido, eram amigos. – O que fazem por aqui?
– Só o de sempre, rindo e brincando. – Ele me respondeu.
– Ainda usa essa “bolsa de homem”, Gabriel? – Perguntei-o e indicando sua pasta
– Ei! Não fale mal da minha bolsa de homem! – Ele ria, é sempre assim. Implico com a bolsa dele. É algo estranhamente divertido.
– Tudo bem... Está a fim de nos pagar um refrigerante? – Perguntei a ele, pois sempre costuma fazer isso quando nos encontramos.
– Ok, esperam aqui? – Disse ele ao pegar sua bolsa e se encaminhar para o pequeno mercado do outro lado da rua.
– Ei! Por que está levando a bolsa? – A garota o perguntara.
– Por que minha carteira está aqui. – Ele respondeu já em meio a rua
– E por que não pega só a carteira e deixa a bolsa?
– Por que já estou no meio da rua...
– Doido... – Conclui o recente fato e meu olhar caíra sob a garota – Então, Srta. Isabela. Como está?
– Bem, eu acho.

Aproximei meu rosto de sua face fazendo uma expressão considerada “má” pela maioria das pessoas, por alguns era até mesmo assustadora, com intenção de ver o que ela faria. Ao encostar nossas testas, ela me disse:

– Não tenho medo de você.
– Sei disso. Não quero que tenha medo de mim. – Ainda com nossas testas juntas, reparei em sua pupila. Maior do que o normal. Dilatada. Sorri e afastei-me. – Sua pupila está gigante, sabia?
– Hunf! – Ela virara o rosto emburrada. Eu simplesmente continuei a sorrir.

Sentei-me na grama, de olhos fechados, massageando minha perna, afinal de contas, dor não é algo agradável para ninguém.
– Como está a perna? – Ouvi a voz de Gabriel perguntar.

Ao abrir meus olhos, deparei-me com ele em minha frente segurando uma garrafa de Coca-Cola. Sorri de lado, movimento involuntário e natural de quando vejo uma garrafa daquelas.
– Na medida do possível, na mesma... – respondi ainda com os olhos voltados para a garrafa – Sabe que não a única mudança seria piorar. E isso eu espero que não aconteça.
– Todos esperam. – diz ele acabando com a tortura e finalmente abrindo a garrafa.

O som que fazia e o cheiro que exalava... Sim, sempre fui estranho. Principalmente quando o assunto é Coca-Cola. Consigo sentir o cheiro dela a uma distancia certa. Não sei como nem por que. Só sinto.
Ele percebe o meu olhar sob a garrafa e a passa para mim apos seu gole rápido. Por ele ter pagado, ele quem deve tomar o primeiro gole. Um ato justo que aprovo.
– Tem quanto tempo desde a ultima vez? Duas semanas? – Pergunto antes de beber.
– Acho que mais... – Responde-me e logo em seguida me ajuda a levantar para que andássemos um pouco.

Ofereço a garrafa a Isabela, ela toma do refrigerante. Talvez por educação, pois depois disso não a vi beber mais.
Enquanto andávamos, conversávamos sobre as coisas. Tudo que acontecia conosco, contávamos o que nos havia acontecido desde que nos encontramos pela ultima vez.
Enquanto caminhávamos pela linha do trem, que há muitos anos não mais existia, a chuva voltara. Fazendo-nos procurar abrigo em algum lugar.
– Em baixo de uma arvore? Ótimo lugar pra se ficar durante uma chuva... – Queixei-me a eles.
– Por enquanto vai ter que servir. – Ele disse
– Daqui a pouco a chuva diminui e vamos procurar um lugar melhor. – Ela disse.

Talvez também estivesse preocupada com o fato de estarmos em um lugar como aquele, mas eu ainda duvido.
A chuva parecia que logo pararia, mas não tão logo.
Enquanto nos encarávamos, somente o som da chuva caindo impedia o silencio de se instaurar. Carros passavam ao nosso lado. Por questão de sorte não espirravam a agua da estrada em nós.
– O que fazem ai na chuva? – perguntou uma mulher no carro que acabara de parar ao nosso lado.

Era a mãe do Gabriel. Estava no banco do carona. Logo quem dirigia era seu pai.
– Nada não mãe. – ele respondeu
– Não querem uma carona pra algum lugar? – ofereceu ela
– Não precisa. Daqui a pouco a chuva para e vamos pra algum lugar mais protegido.
– Tudo bem, vocês quem sabem. – disse ela voltando-se para frente enquanto partiam nos deixando ali
– Bom ver você de novo senhora – eu disse, acenando, pouco antes de a janela se fechar.

Ela acenou de volta e partiram.
Voltamos a nos encarar. Eu continuava com a garrafa em minhas mãos.
– Sabe me sinto como um bêbado com a garrafa assim na mão. – Um comentário engraçado. Afinal a garrafa ainda estava envolvida na sacola em que viera, e eu a segurava pela boca, quase literalmente.
– Realmente parece um. – Ria Isabela
– Não sei se repararam, mas a chuva parou. – Constatou Gabriel a nós.

Eu não havia reparado. Estava ocupado. Não importa com o que.
– Vamos para onde agora? – Perguntei ainda distraído levando a garrafa à boca.
– Que tal irmos no Mustang? – Sugeriu Gabriel.

Mustang, um ótimo amigo. Sempre cheio de histórias de vida e opiniões fortes.
– Ele está no trabalho agora. – Respondi
– E quando ele volta? – Perguntou Gabriel, desanimado com o fim da sua, possivelmente única, sugestão.
– Quase meia-noite.
– Ah! Mas tem o bar do outro lado da rua da casa dele! – Disse ele animando-se novamente. Isso é algo que admiro nele, ele consegue se animar muito rápido.
– Acha que podemos ir pra lá? – Isabela perguntou. Ela parecia receosa. Talvez o fato de sermos todos menores perante a lei.
– Ah, eu estou barbudo, o Luigi também e você está conosco. – respondeu Gabriel – Então acho que não tem problema. E afinal, nem vamos beber. Só nos proteger da chuva. No máximo mais uma Coca-Cola.
– Mais uma Coca? Seria ótimo. – disse já jogando a garrafa vazia na lixeira – E dessa vez vocês tem que tomar mais do que um ou dois goles. Sinto-me mal por tomar a coca praticamente toda sozinho, sendo que nem fui eu quem pagou por ela!

Riamos enquanto caminhávamos rumo ao nosso novo destino.
Faltavam apenas duas quadras para chegarmos quando vi.
– Só pode ser sacanagem... – Murmurei.
– O que? – Ouvi me perguntarem, eu apenas encarava o lugar.
– Tá fechado... – Apontei para o bar.
– Droga! – Ouvi Gabriel reclamar.
–Ainda podemos sentar na calçada e aproveitarmos o toldo para nos proteger da chuva. – Disse Isabela
– É... – Desanimado, sentei-me encostando as costas na parede do bar.

A chuva tornara a engrossar. Eles haviam começado a falar sobre assuntos que só a eles era conhecido. Eu já não mais os ouvia, estava concentrado... Olhando a chuva cair, o céu passando de uma cor cinza chuvosa para um tom negro noturno.
Quando a chuva decidira parar, definitivamente dessa vez, decidimos voltar à pista.
Eles precisavam pegar suas caronas para que fossem levados para suas casas. Eu, por outro lado, não precisava ir a lugar algum. Então seguimos para o final da pista, onde os carros podiam passar tranquilamente.
Lá, eles ligaram para seus pais. Pedindo para irem lhes buscar.
– Ah! Não vou ficar aqui sozinho nessa! – Disse tirando meu próprio celular do bolso e fazendo de conta de que estava falando com alguém.
– Não precisa fazer isso, eu já terminei. – Isabela me disse.

Eu apenas sorri e a abracei.
Ela retribuíra meu abraço sorrindo.
Aproximei meu rosto do dela. Sentia sua respiração, nossos narizes roçaram um no outro e, de maneira inexplicável, mesmo com o frio seus lábios permaneciam quentes.
O toque dos lábios dela nos meus era algo inexplicavelmente bom. Melhor do que bom. Por falta de palavra melhor, era incomparável.
– É engraçado. – Eu disse. Um sorriso de lado insistia em permanecer em meu rosto.
– Por quê? – Ela me perguntara, sua voz estava calma, quase sussurrando.
– Não sei, só é. – Sorrindo, tornei a beija-la.

Naquele momento, eu realmente não sabia. Mas agora tenho uma ideia geral de por que.
Gabriel, que até então ainda falava no celular, nos encarava. Com um sorriso idiota no rosto. Enquanto a beijava novamente, mostrei-lhe o dedo do meio.
– Que bonitinho. – Disse ele fazendo voz de criança.
– Vê se morre cara. – Respondi a ele.
– Tudo bem. – Disse ele, virando-se para a palmeira que havia perto. – Quer dançar?

Eu simplesmente não acreditava, ele realmente pedira a palmeira para dançar... E começou a dançar com ela. Foi uma das cenas mais estranhas que eu poderia ter visto.
– Eu podia dormir hoje sem ver isso...
– Dois – Afirmou Isabela.
– Você só pode ter muitos problemas Gabs. – Disse a ele, arqueando as sobrancelhas.
– Tenho dois. Uma com 1,73m e outro com... 1,76m?
– 1,77m. E não se esqueça disso. – Respondi, abraçado a Isabela.
Eu comecei a cutucar o umbigo dela.
– Para! – Ela pedira a mim.
– O que? – Gabriel perguntou a ela
– Ele está cutucando meu umbigo!
– O que posso fazer se gosto do seu umbigo? Ele é fundinho... Sabe é bom pra cutucar...
– Não é! E para com isso!
– Tudo bem... – Respondi e em seguida lhe mordi a bochecha.

Começamos a nos morder, enquanto Gabriel tornara a dançar com a palmeira. Até que em certo momento ele perguntara:
– Vão ficar se comendo ai por mais quanto tempo?
– Morra... – Ela respondera.
– Só uma pergunta. Vocês tiveram o dia inteiro pra isso, por que só agora que o dia está no fim?
– Por que... Amamos a noite. Principalmente quando é uma noite chuvosa.
– É. – Concordou ela comigo.

Apos isso paramos de nos morder, com a condição de que ele pararia de dançar com a palmeira.
– Ah sim, Gabriel, posso pegar carona com você? – Ela pedira, embora na hora tenha parecido um aviso.
– Sem problemas.

Estávamos conversando novamente, não me recordo mais sobre o que. E se eu não recordo, não devem ter sido lá tão interessantes quanto pareceram na hora.
Não muito tempo depois, ouvimos o som de uma buzina. Eram os pais de Gabriel.
– Vou avisar que você vai comigo. – Disse ele indo em direção ao carro.

Enquanto esperávamos que ele voltasse, voltamos a nos beijar. Mas bem diz o ditado que sempre vai haver uma mosca na sopa, ele voltou rápido. Rápido demais para o eu gosto.
– Se você vai, tem que vir logo. Despeçam-se rápido, não uma despedida de meia hora. – Disse ele, não sabia dizer se ele sorria por deboche ou por ser realmente algo engraçado.
– Morra. – Respondi.

Um leve, e rápido, beijo a mais.
– Tchau... – Uma despedida singela, mas ainda assim... Não sai mais de minha mente.

Eles correram para o carro, eu acenei e logo partiram...
Enquanto caminhava para casa, havia um sorriso idiota, como eu mesmo passei a pensar. Um sorriso que ninguém seria capaz de tirar do meu rosto.
Pela primeira vez em muito tempo, não me sentia solitário ao andar sozinho. Não me sentia tão triste quanto antes. Sentia que seria capaz de voltar a escrever... E realmente eu o fiz, embora eu já esteja escrevendo essa crônica há quase um mês...
O que importa é que, finalmente, terminei-a.
E que fico repetindo aquele dia diversas vezes em minha mente.
Um dia em que eu passei a amar mais ainda à noite. A amar mais ainda as noites onde a chuva passara.
O dia na qual, eu senti. E isso, ninguém pode tirar de mim.